2.4.05

O Retrato

Um dia destes um engenheiro fez com que me lembrasse de Dorian Gray.
Terei lido o livro em mil, novecentos, e sessenta e troca o passo, e já nem sequer me lembro muito bem da história. Acho que tinha a ver com um retrato de um tipo e tal, e que falava de juventude, vícios, virtudes e assim.
Mas o efeito da recordação tem a ver com outra coisa. Traduzindo.
- Ó Eduardo, você que é um barra em computadores (gentileza dele) e está sempre a falar de blogs, faça-me lá um retrato dessa malta.
Eu que até sou um indivíduo lesto e desinibido, engasguei-me.
Toda a gente sabe que o Tico e o Teco (como diz a titas) são os neurónios mais rápidos do mundo. E em fracções de segundo muita fotografia me veio à cabeça. Nos dois minutos de silêncio que se seguiram, passaram no meu ecrã os retratos mais diversos. Putos pedrados e homens de negócios, solteironas, professores reformados, educadoras, barriguinhas salientes, malta do bairro, papagaios, jornalistas e outros desempregados.
Puxei de um cigarro para ganhar tempo de resposta e, de cada vez que me embrenhava nos perfis para tentar bater a chapa, a confusão instalava-se ainda mais. Como definir o retrato de alguém que apenas conhecemos pelas palavras? E se tudo isto é um embuste de personalidades duplas e dúbias? E se o gajo que eu tenho por amigo, afinal é um gaja? Ou vice-versa. Estarão os blogs a retratar fielmente a pessoa que está por detrás deles?
Custa-me admitir que não consegui satisfazer o pedido do meu interlocutor.
- O Sr. Engenheiro desculpe, mas não sou capaz!

Volta e meia ainda me espicaça: - Então Eduardo, já fez o retrato?

Sacana!

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