20.2.05



"Chamam-te fama e glória soberana ,
Nomes com quem se o povo néscio engana."
Canto IV, est. 96, vv. 7,8

O Velho do Restelo

Acompanhando de perto as motivadas gentes, feitas por momentos “salvadores” da Pátria, meti-me à estrada. Descobri escarpas de vontades esquecidas e campos onde as “mudanças” das portas que Abril abriu nunca se encontram.
De apagados que estão todos os cultos. De escondidos que estão todos os sábios.

As novas que trago são já velhas. Ressequidas pelo tempo que não faz, alagadas pela chuva que não cai neste país. Pobre e triste. Resignado e escravo.
Desiludam-se pois, os esperançados. Todos quantos depositam no dia de amanhã um rumo novo ou uma nova era. Todos aqueles que pretendiam outra etapa.
É tudo um jogo.

Um jogo que o fogoso tempo da minha juventude fez abandonar a esperança e o encantamento nas coisas raras. Um jogo de poder que traiu a fé nos homens e mulheres que nos governam. Onde o pano abre sem se ter escutado de Molière todas as pancadas. Em que o happy end nunca tem lugar e onde as trapaças duplicam como apostas.
Eu vi. Eu estive lá, considerado como sendo deles.

Seja qual for o resultado, amanhã continuaremos ao sabor das velas que não abrem. A remar contra marés sempre vazias e enredados no odor do sabonete Palmolive.
Continuaremos a projectar futuros e a adiar decisões. A desconfiar do vizinho e a fazer duma mentira uma verdade até que chegue o dia da natureza obrigatória.

Por mim, e de qualquer das formas, mais revoltado não posso estar ao longo de estes anos todos . E é naquele pedaço branco de papel que o vou dizer, assim como todos os anarquistas da minha mocidade.
Mas não é por eles que o faço. É pelo meu direito à Revolução.

Portanto, vou ali derrubar este governo e volto já.


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