29.12.07



O Natal que (nunca) tive

Por escolha pessoal, este foi o ano com um Natal que nunca tive. Nem mesmo em criança, quando as dificuldades dos meus pais eram gritantes e que mesmo, de qualquer forma e com muito sacrifício da parte deles, havia sempre umas prendinhas na chaminé junto ao sapatinho que o meu pai nunca deixava deteriorar, já que era mestre bate-sola, e uma mesa pobrezinha mas bem composta no tempo em que o bacalhau era o prato favorito dos menos prósperos.

Por outro lado, recusei educadamente todos os convites e quis passar pela experiência de não ter natal. Masoquismo? Talvez não. De que outra forma poderia entender aqueles que estão “obrigados” a não tê-lo há muitos anos e tentar explicar aos netos e divulgar experiência tão dolorosa? De que outra forma, se pode sentir na pele a triste realidade do meu povo sofrido, como diz Elisa Lucinda?

Serviu-me de exemplo.
O olhar para uma mesa vazia faz doer os olhos. Dar pela ausência de pessoas a que se está habituado, estranha-se e rasga-se qualquer coisa em qualquer um. O facto de ter, ao menos, um tecto protector não ajuda muito ir lá mesmo ao fundo. Faltou o andar na rua, ter o nevoeiro a tapar a visão, e sentir o frio e a chuva a fustigar o rosto de todas as esperanças que pudessem ainda restar de que apenas se esteja a sonhar.

Muito provavelmente, na passagem d’ano vou mudar de rumo. Socializar-me. Enfrentar o novo Ano com uma réstia de confiança que me faltou nestes últimos quatro meses.

Até lá, a gente vê-se por aí.

Sucesso, saúde e sorte, é o que me apraz desejar a todos quantos passarem por aqui. Aos que não passarem, também.

23.12.07



Era nesta antevéspera de Natal, em mais um dia 23, que se me colavam aos olhos águas fortuitas.
Era neste dia que se espalhavam aromas e paladares por aquela casa, que só ela sabia fabricar.

Hoje, já nada resta.
Vazio o espaço. Mesa sem nada sobre a toalha bordada à mão, com imensas recordações para poder contar. Mas não consigo.

Talvez aguente a nostalgia ao ir passando pelos lugares de amigos que descobri com esta brincadeira séria nos espaços pessoais.
O que não consigo é quebrar o gelo desta saudade. Desta amargura que se me enrola na garganta quando trinco qualquer guloseima de Natal que ELA fazia.

Até a pena lírica com que escrevinhava sensações se quebrou. Evaporou-se a tinta e acabaram-se-me as folhas frias de papel nestas noites que ficam demasiadamente longas. Frias. Sem telhado onde me abrigar porque, ao que parece, o meu Pai Natal estatelou-se na visita que fazia todos os anos à nossa casa.


Resta-me a vontade e o consolo de vos ir vendo por aí.

Até sempre.

16.12.07



Provavelmente... é Natal!


Provavelmente, à medida que o tempo vai passando, os dias que se seguem trazem solicitude, amargura e saudade no que me toca, e coisas felizes em outras gentes a quem a vida quis que fosse assim.

Provavelmente, à medida que o tempo vai passando, nunca quis que os caracteres deste teclado, nesta conjuntura de escrever às pessoas que não conheço sem ser virtualmente, se apagassem com a humidade que jorra dum sítio que não digo. Que as palavras que escrevo, parvamente e taciturno, se diluíssem no vazio duma quadra que para mim não faz sentido num ano de lençóis frios. De cama e mesa vazias. De janelas onde antigamente piscavam luzes.

Provavelmente, à medida que o tempo vai passando, soltam-se e saltam crianças e casais felizes a estas horas deste Dezembro gelado. Risos e abraços que não consigo partilhar, com pena minha, nas casas abertas onde estes últimos anos mantive um laço mais apertado, e aonde não me cabe entrar. Por respeito e admiração. Por privacidade alheia. Não ser incómodo é a palavra certa, e há um nó que me atravessa a garganta quando utilizo as teclas deste velho e enferrujado computador.

Por isso, cabe-me desejar daqui a todos um Bom Natal neste meu espaço que se tornou triste.
E muito provavelmente, resta-me passar o meu da melhor forma que puder, desejando a todos quantos passam por aqui que estejam melhores que eu na minha maior prova de fogo: sem Pikena, sem Mãe (internada no Barreiro), sem filhos e netos (estou a trabalhar) e, provavelmente, sem a visita do barbudo da Patagónia. Ou mais alguém , a quem a vida, temporariamente a esta hora, não está a sorrir da forma mais conveniente. Mas só a curto espaço, acredito eu.

De qualquer forma, vou abraçar-me a esta facilidade de entender.