31.3.05

Memórias de mim

Quando eu era pequenote, a infância (e mergulho fundo na minha infância, esse grande território de onde todos saímos com medalhas e mazelas), era um Mundo!
Um mundo só meu, onde entrava só quem eu quisesse.

“De onde eu sou?” – perguntava-me. “Sou da minha infância como se é do meu país...”, escrevia já Saint-Exupéry n’O Piloto de Guerra. Todos, realmente, comprovamos isto diariamente. O mundo interior povoado de imagens e recordações, muitas delas nebulosas, outras bem mais nítidas, que têm origem nos anos verdes da mocidade de cada um de nós.
Em muitas ocasiões, temos até de recuar a essas épocas da nossa vida para compreendermos algumas atitudes, hábitos, reacções, tendências, que fazem parte da nossa maneira de existir, da nossa forma de pensar, da nossa forma de sentir.

E aqui entram alguns dos meus heróis. Cada qual com o seu tempo e no seu espaço. Um tempo de Fúria e de Lassie, que ainda hoje sinto serem essas as referências que me fizeram gostar tanto de cães e de cavalos. Li quase todas as estórias de cow-boys e vesti-os na pele. Armei-me em Zorro e em Tarzan. Quis ser Robbin dos Bosques e almejava por beber a poção mágica do Astérix. Passeei em França sem sair de casa com Tin-Tin e conhecia tão bem o Brasil do Tio Patinhas que mais parecia ter lá vivido. Adorava os filmes do Bonanza, do Rim-Tim-Tim e ninguém me tirava da carpete enquanto o Mr. Ed, o cavalo que falava, não acabasse. Existia até uma maneira razoável de comer legumes: imitar o Popeye e de seguida demonstrar a minha força no primeiro puto da minha rua que encontrava.

Um pouco mais tarde, com escolaridade um pouco mais avançada, aventurei-me com D. Quixote e descobri a Lua com Verne, convivendo de perto com novas gentes e novos mundos. Soube de meninos pobres como eu - que Dickens me relatava - e onde Dostoievski também fazia parte dos meus planos. Amei. Amei livre e apaixonado, como só naquele tempo se podia amar, as donzelas de D.H. Lawrence. E, quase ao mesmo tempo, por volta dos doze, tornava-me Corsário. Destemido e acérrimo defensor de causas perdidas, que me fazia andar à espadeirada como se dos Três Mosqueteiros fizesse parte. Sem antes, ter todos os cromos daquele tempo, mas nunca me ter saído "a bola". O tempo do Benfica europeu, da guerra colonial, de Amália, da minha infância.

Tempos bons, esses do berlinde e do pião. Do arco e do carrinho de esferas. Das fisgas.
Agora sou o que sou, mais tudo aquilo por que passei. Em tempos idos dizia-se que “a Cultura era tudo o que resta depois de ter esquecido tudo o que se aprende”. Talvez fosse. Até ao momento em que apareceram os blogs. Estes desnaturados que me fazem engordar.

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26.3.05

LISBOA!

Engraçado como esta quadra me une à minha cidade. E amanhã ainda mais.
É que foi, precisamente, há meio século e mais um ano que ela me viu nascer.
De modo algum faço anos amanhã, mas nasci num dia de Páscoa.
Que por acaso também era domingo.




ps - Agradecimento especial para a Cachopa e o Morfeu, pelas prendinhas da Páscoa que me enviaram pelo correio.

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23.3.05

Os versos que te fiz

"Deixa dizer-te os lindos versos raros
Que a minha boca tem p’ra te dizer!
São talhados em mármore de Paros
Cinzelados por mim p’ra te oferecer.

Têm dolência de veludos caros,
São como sedas pálidas a arder...
Deixa dizer-te os lindos versos raros
Que foram feitos p’ra te enlouquecer!

Mas, meu Amor, eu não tos digo ainda...
Que a boca da mulher é sempre linda
Se dentro guarda um verso que não diz!

Amo-te tanto! E nunca te ocultei...
Que neste beijo, Amor, que já te dei
Guardo os versos mais lindos que te fiz!"

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21.3.05



Primavera Bloguista

Costumo dizer em tom de brincadeira que depois da invenção da roda e da fundação do Sport Lisboa e Benfica, os blogs foram a melhor coisinha que me aconteceu desde que me endividei para comprar um computador. E não vale a pena tentar perceber porquê, porque eu explico.

Parece difícil de crer que houve realmente um tempo em que a minha vida era explosiva, preenchida e divertida. Não apenas pela permissão da juvenil idade e disposição, mas também pela naturalidade como conhecia pessoas interessantes e coisas assim.
Aos 18 anos era já dono de uma substancial cultura básica, um pouco acima da média dos putos broncos da minha rua e, passe a imodéstia, até era considerado o exemplo do tipo esperto (e um bom partido, hehe…) pelas miúdas da escola no quarteirão mais à frente.
Porque a política estava então amordaçada, os perfis mais significativos que podia transmitir à malta da minha juventude tinham a ver com as sinaléticas culturais da época: o Tarzan e o Bill the Kid. Só mais tarde se seguiria Spencer Tracy, Abbott e Costello e o D’Artagnan.
Viciado em aventuras do género e nos discos do José Cid pela vida fora, nunca imaginei que para além da janela do segundo andar onde morava, existisse outro mundo. Mais abrangente e diversificado, mais tendenciosamente cultural e de grandes repercussões no planeta. Isso mesmo. Descobri os blogs!

É a eles que devo a rápida e forçada aprendizagem das línguas. Foi neles que descobri a Condessa de Ségur, o Pacheco Pereira e as trouxinhas de bacalhau. Foi por eles que tomei conhecimento dos lagostins-marmanjolas imunes à dor física e o segredo de Fátima. É deles também a responsabilidade de se saber o código Da Vinci, o código da Estrada e o código do Messenger.
Aliás, foram os blogs que me fizeram entender melhor o protocolo do Kioto, o acordo ortográfico e o Alberto João Jardim. E para não dizer que sou ingrato, é nos blogs que tomo pela primeira vez plena consciência do direito do contraditório, do estudo da Spina Bífida e da memória colectiva de Vilarinho das Furnas.

Qual Der Spiegel, qual Time? Os blogs, até na Quirguízia são o fiel retrato de que não existem distâncias e fronteiras nesta nova maneira de saber das coisas.
Quem seria eu hoje sem eles, hã…?

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20.3.05



Tínhamos prometido que quando começasse a chover, eu e o John Kid, ficaríamos toda a noite a ouvir Falco. É hoje!

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19.3.05



Nostalgia dos dias pardos.

Nunca se tem em demasia quando se fala de Amigos!
Há os amigos de ocasião, os amigos de Peniche, os amigos do peito, os amigos da onça e os amigos do alheio. Mas quase todos temos - pelo menos - mais um amigo: o Pai.

E amigos amigos, negócios à parte, o Pai é o amigo que nunca devíamos perder. Aquele cuja amizade nos acompanha a vida toda. Aquele de quem imitamos exemplos, gestos e outras fantasias. Aquele com quem completamos os nossos desvarios, as nossas loucuras de meninos. O personagem omnipresente. O nome que nunca mais nos larga.

Uma nódoa negra, um braço partido, um joelho esfolado, temos o Pai. Uma camisa aos quadrados, um dente arrancado, casamento marcado, temos o Pai. Angústias disfarçadas, sonhos perdidos, pequenos fracassos, temos o Pai.
O Pai é o estilo faction, o primeiro livro, o nosso orgulho. É magia, palco do mundo, natal dos dias. Janelas, portas abertas e maresias.

Quando o perdemos, uma parte do corpo é decepada. Ficamos agrestes, ao sabor do vento que nos arrasta para a nossa própria vida. Damos conta de uma revolta surda e o mar perde um pouco a sua cor. Viramos fera ferida, presa ameaçada. Segredo velhacamente profanado em dias pardos como este.

Perdi o meu a 19, faz tempo. Trezes anos, para ser mais rigoroso.

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15.3.05



Atarefado, mas vivinho da costa

Esta semana tenho que andar assim.
Estou num horário lixado, que nem é carne nem é peixe, e é provável que não consiga acompanhar todos os blogs da rapaziada amiga. Muito menos, outros que também prezo.
Por isso, não estranhe se calhar a si eu lhe aparecer só p'rá semana.

As minhas desculpas.

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13.3.05


Desenho de Javier Calvo


Porque a Sofia está a dormir, os Netescritores fazem um ano de blog e já não vejo ninguém à frente do Benfica.


As minhas sugestões:

- "Memória das Minhas Putas Tristes" de Gabriel García Marquez
- "Million Dollar Baby" de Clint Eastwood
- "Badoca Park"

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11.3.05



Provavelmente, hoje, quase toda a gente fala, ou falará, sobre terrorismo.
Eu também o faço, não numa de análise sociológica ou vincadamente partidária, (sou inculto o bastante para que possa aprofundar o assunto), mas apenas como se estivesse a deambular sobre o tema com amigos à mesa do café a ver passar mulheres vistosas.

Sobre actos perpetrados em solo nacional, os portugueses não se podem queixar. O sermos pacatos, obedientes, e não constar da lista das ameaças estrangeiras, muito menos invasoras, são pontos a nosso favor. Ao contrário de países poderosos, onde a força política instalada agride, interfere, invade, rouba, mata e sacrifica outros povos para seu próprio benefício, em nome de sei lá quantos disparates e ganâncias, que seria de esperar senão uma retaliação que posso muito bem apelidar de legítima defesa.

Esta afirmação pode custar-me cara, da forma como será entendida. Pensarão: “este gajo defende o terrorismo!”? Nada disso. Mas entendo-o.
E não ter passado por situações que os chamados actos terroristas provocam, não me impede, também, de entender a dor, o sofrimento, a revolta de quem, diz-se, não ter nada a ver com isso. Mas tem. Os analistas na matéria não o escondendo, velam-no.
E os politicamente correctos sabem disso.

A sociedade actual funciona dum maneira tão indecorosa que o cidadão comum não se apercebe que é carne para canhão, moeda de troca. Seja em Jerusalém, em Nova Iorque, Bagdade ou na Cochinchina. Os veículos de transmissão das regras impostas pelos senhores do mundo encarregam-se disso. Os submissos também.

Os tempos são outros, pode-se contrapor. Está certo. Mas as lutas continuam as mesmas. O que mudou foram os métodos. E desde que o mundo é mundo, o Homem sempre quis ser um caçador nato. Mas qualquer presa tem o direito, e o dever, a defender-se do predador.

É importante não descurar esse pequeno pormenor.

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8.3.05



Elas sorriem quando querem gritar.
Elas cantam quando querem chorar.
Elas choram quando estão felizes.
E riem quando estão nervosas.

Elas lutam por aquilo que acreditam.
Elas levantam-se na injustiça.
Elas não levam "não" como resposta quando sabem existir melhor solução.
Elas andam sem sapatos novos para os filhos poderem tê-los.

Elas vão ao médico com uma amiga assustada.
Elas amam incondicionalmente.
Elas choram quando os filhos adoecem e se alegram quando ganham prémios.
Elas ficam contentes quando sabem de um aniversário ou um novo casamento.

Pablo Neruda

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7.3.05



Os Netescritores

“Ao amigo Eduardo que quase todos os dias nos visita e que com atenção lê tudo o que escrevemos…”

Por natureza sou um indivíduo excessivamente sensível a tópicos que me tocam mais de perto e não sustenho com facilidade a fase lacrimante da consequência.
Quando se trata de crianças, então, é o caos total e os meus sentidos ficam em cacos.
Num acaso, vai para um ano, descobri estes pequenotes e nunca mais os larguei. Assim como outros bloggers onde a amizade virtual se fez obrigatória.

Na mensagem recebida que acima transcrevo uma parte, senti-me como se eles, além dos sete filhos que tenho, e quase igual número de netos, dos meus fizessem parte.
Como crianças que são, admiro-as. A rebeldia dos seus actos surpreende-me. A pureza com que se manifestam transcende-me.

E estes pequenotes estão na sua fase de afirmação pessoal. Estão agora a descobrir de como é feito o mundo e a definir a sua própria escolha entre o que é bem e o que é mal.
Fazem-no de diversas formas e com os meios que têm mais à mão: o computador e o blog. São crianças que nos contam histórias, escrevem poemas e cantam livremente o que o seu pequenino/grande coração transporta. De modo simples como fazem todas as crianças. E com o apoio incondicional da sua professora vimaranense: a Emília Miranda.

Deles, tenho a estima. O carinho e a certeza de que estão no rumo certo.
Para eles tenho apenas uma palavra: Obrigado.

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6.3.05



Há dias assim

Hoje, não sei porquê, sinto-me assim-assim.
Ou é da terra girar mais rapidamente do que o costume, (facto que me põe a cabeça em fanicos) ou da variedade de pessoas que não conheço mas que me assinalam e me acarinham.

Por um lado, sinto-me bem. Talvez pelas comodidades e atenções de que sou alvo e sinta como duma qualquer transcendência orbital tivesse renascido.
Por outro, desgasto-me a pensar como retribuir e fico mal. Parece que me sinto anulado, incapacitado e ao quadrado. Sou capaz de estar absorvido até, para uma melhor compreensão pedagógica da coisa, por algum malefício asiático ou por algum vírus que ninguém ainda descobriu.

Seja como for, incrédulo como sempre fui, pode ser que o futuro que me resta seja a resposta ao passado que nas mãos de outros existe. Para bem de todos e de mim. Mesmo que sejam filhos da fruta. E sabe porquê?. Porque há dias assim.

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1.3.05



Esta coisa de escrever nos blogs tem muito que se lhe diga.

Se por acaso, o espaço em branco abaixo introduzido fosse propriedade sua, o que lhe apetecia escrever que não possa dizer no seu?
















.Está a ver? Não é tão fácil assim...