19.3.07

Dia 19 (clique para ouvir Chico Buarque)

Lembrar-me do meu pai não é difícil. Cada vez que o faço recuo no tempo e chegam-me à memória retratos de família: aquele afago, um carinho, um chupa-chupa como prémio por me ter portado bem.
Homem simples de raiz alentejana, marcou-me sempre. Quase anónimo, pobre de finanças e analfabeto, batia solas em busca do sustento e fazia versos que não escrevia. Cantarolava modas da sua terra de Odemira e vivia um dia de cada vez.

Sabendo da importância que uma mãe tem na vida duma criança, do pai fica quase tudo. Copiamos a figura. Imita-se-lhe os gestos e segue-se-lhes as pisadas. Mesmo depois da incontornável separação que a própria vida nos impõe em dada altura, o pai é sempre a primeira moldura que se vê quando se abre a porta da nossa nova casa.

Por isso, hoje recordo o meu.
Arrependido apenas por não ter conseguido viver mais tempo ao seu redor e, como sempre nas limitações dos mortais, não poder voltar um pouco atrás.
Mas nada podia fazer. A morte levou-o cedo.
Cedo demais, presumo eu.

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