24.4.07



Por vezes me interrogo se comemorar Abril ainda fará sentido.
A distância que me separa de 1974 é cada vez mais longa. A imagem menos nítida. O som das botas na calçada menos sonoro e estou a envelhecer ao lado duma esperança que nunca dali saiu.

Falta-me o vigor dos vinte anos com que assisti à queda do regime. Perdi já o fulgor da juventude entusiasmada naquele sobe-e-desce constante pelas ruas de Lisboa. Deixei de ver realizadas as promessas que a nova ordem das coisas apregoava.

Em dados momentos, é-me desagradável constatar que perdi o rasto dos poetas e dos pregões. É-me penoso pensar que, passados trinta e três anos, o meu povo continua cómodo e casmurro. De cinzento vestido. Desgarrado e triste. Obeso de formas consentidas.

Em mim entristece-se-me a figura. Falta-me o brilho dum olhar novo. Rareiam as causas em que acredito.
Provavelmente, estarei azedo. Desiludido e parvo.
Mergulhado talvez na dúvida se Abril ainda terá razão de ser.

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